segunda-feira, 13 de abril de 2020

Voltando pra casa.

Antes de voltar pra casa, tive que passar por mais um susto.

O Chiquinho já estava do lado de fora, me aguardando, e eu ainda tinha que fazer alguns de meus rituais, fechar a gráfica e mais uma vez lavar as mãos.

Se qualquer situação, por mais simples que seja, pode me trazer ansiedade, imagine deixar alguém esperando. Tentei fazer tudo o mais rápido possível e saí com passos acelerados. Chegando praticamente no portão, eis que dou um chute com toda a força num ar condicionado quebrado, que estava no chão.

O chute foi tão forte que quase arrancou meu dedo fora. Lembrando que eu estava de chinelo de dedo.

E começou a sair muito sangue. Muito. Ou seja, a pressa não adiantou de nada. Abri o portão e falei com o Chiquinho que teria que lavar o meu pé, e voltei para gráfica. E fiquei alguns bons minutos aguardando aquela hemorragia de terceiro grau cessar. Foi quando o gatilho disparou.

"E o coronavírus? E se ele entrar pelo meu dedão e subir até o meu pulmão?"

Já disse que me considero um cara esclarecido. Sei que a contaminação pelo dedo do pé é impossível, mas estou tentando mostrar para vocês como as coisas funcionam. Nossa mente cria teorias das mais absurdas, quando o gatilho é disparado. Pode demorar segundos, ou até horas para cairmos na real. Depende do momento.

Não fiquei neurótico, mas confesso que evitei encostar o pé no chão até chegar em casa.

Minha volta com o Chiquinho foi exatamente igual à ida. Ele falante, e eu tenso, respondendo suas perguntas para o nada. Mas eu estava mais preocupado em como eu iria fazer para entrar em casa, pois eu havia ficado o dia inteiro exposto aos inimigos. Dos pés à cabeça, incluindo a batata da perna.

Chegando na portaria do prédio, preparei uma "Operação Resgate":

"Mãe, sou eu.
Câmbio."

"Graças a Deus, meu filho"

"Estou na portaria, siga toda as minhas instruções.
Câmbio."

Tá bom, meu filho"

Prepare um pano encharcado de água sanitária e coloque na porta. Deixe também dois sacos plásticos, abertos e coloque no chão. Coloque o álcool em gel em cima do tanque. Deixe a tampa da máquina de lavar aberta.
Câmbio."

"Tá bom, meu filho"

"Conte até 30, abra a porta e vá para o sofá. Não saia de lá até ouvir meu comando. Diga para a Patrícia não sair do quarto também.
Câmbio final"

"Só isso, meu filho?"



E assim foi feito. Subi pelas escadas, é claro, e assim que cheguei no apartamento estava tudo como eu havia pedido. Tadinha da minha mãe, ela é uma santa.


Antes de entrar, limpei meus chinelos no pano com água sanitária. Abri um dos sacos plásticos, joguei os chinelos dentro e dei dois nós, para garantir o lacre. Durante este processo, eu já estava limpando os pés descalços no pano.

Peguei o outro saco plástico e joguei meu celular, carteira, chaves e moedas. Logo após, tirei minha camisa e minha bermuda, e como um jogador de basquete, arremessei as duas peças dentro da maquina de lavar que estava aberta. Tudo isso sem entrar em casa. Reparem que fiquei de cueca no corredor do prédio.

Foi aí que começou a parte mais difícil.

Entrei, mas evitei ao máximo pisar com toda a base dos meus pés no chão. Pisava com os calcanhares. Entrei, fechei a porta, lavei minhas mãos no tanque, e fui em direção ao banheiro andando feito um pinguim. Complicado e cansativo. E se pudesse, não respiraria durante esse trajeto.

Chegando no banheiro, lavei todos os meus objetos pessoais com álcool e fui tomar um banho de 45 minutos, mais ou menos. 

Missão cumprida. Meu dia havia terminado com sucesso, agora era descansar e me programar para o próximo dia de trabalho.

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